A gravidez é uma fase de profunda alegria, de múltiplas expectativas mas também de dúvidas e ansiedades, em especial quando se trata do primeiro filho. A mulher muda de hábitos e opções de vida, fica muito mais atenta aos sinais que o corpo lhe dá e procura fazer as melhores opções para garantir uma gestação e um bebé saudável.
Em contrapartida, a partir do momento em que as boas novas são anunciadas, não faltam vozes a dar conselhos – solicitados ou não -, a emitir sentenças ou a transmitir pedaços de informação que não maior parte das vezes não correspondem à verdade. Por muito bem intencionadas que sejam essas pessoas, o facto é que perpetuam ideias que não só não ajudam como, muitas vezes, impedem a grávida de desfrutar plenamente do seu novo estado.
Estes são alguns dos mitos mais frequentes durante a gravidez.
“É preciso comer por dois”
Habitualmente, por efeito da hormona progesterona, a grávida experimenta um aumento de apetite, mas “comer por dois” não só não é necessário, como pode ser prejudicial, tanto para a mãe como para o bebé. Um acréscimo de cerca de 300 calorias diárias é mais do que suficiente para garantir as necessidades acrescidas e impede que a mulher ganhe quilos em excesso. Esses, sim, são de evitar: segundo dados da Organização Mundial de Saúde, as mulheres obesas aquando na conceção, ou que ganhem peso em demasia correm maiores riscos de ter diabetes gestacional, pré-eclâmpsia, partos prematuros, recém-nascidos com elevado peso e, no futuro, filhos com maior tendência para a obesidade e a diabetes de tipo 2.
“Todos os desejos têm de ser satisfeitos”
Muitas mulheres acreditam que desejar ingerir um determinado alimento, ou misturas inusitadas de sabores, significa que o bebé “está a pedir” e não satisfazer esse desejo é meio caminho andado para problemas. No entanto, não há qualquer evidência científica de que isso seja verdade. Se satisfazer o apetite por determinados sabores dá mais bem-estar físico e emocional à grávida há luz verde para avançar, desde que esses sabores pertençam a alimentos ou substâncias de uma dieta equilibrada e saudável e que não se exagere nas quantidades. Por vezes, basta misturar morangos com salsichas em lata, ou chantilly com presunto para todas as ansiedades se dissiparem como por magia… E, não, a criança não vai nascer com cara de figo seco se o pai não conseguiu encontrar figos às três e meia da manhã.
Já o apetite por substâncias não-alimentares tem uma origem ainda não completamente esclarecida pela ciência. Há quem afirme que desejar comer terra ou carvão poderá estar relacionado com a tentativa inconsciente de corrigir défices em micronutrientes. O melhor mesmo é conversar com o médico e procurar saber se está tudo bem a esse nível.
“Muita azia? Vem aí um bebé cabeludo”
Este é um dos incómodos mais frequentes durante a gravidez, mas nada tem a ver com as características físicas do bebé, muito menos a quantidade de cabelo, já que estas são definidas pela herança genética recebida do pai e da mãe. A azia, ou pirose, é provocada pelas alterações hormonais, pelo refluxo dos sucos gástricos do estômago, que sobem quando a zona abdominal é pressionada para cima pelo útero em crescimento e também pelo facto de a digestão se processar mais lentamente. Para evitar ser vítima de azia, há que adotar bons hábitos alimentares, evitar alimentos ácidos e condimentados, refrigerantes e bebidas gaseificadas e refeições fritas e gordurosas.
“O sexo pode fazer mal ao bebé”
Se a gravidez for de baixo risco, e não houver indicações médicas em contrário, praticar sexo não causa qualquer problema ao bebé. Ele está bem protegido pelo líquido amniótico no interior da sua bolsa, não vai ficar magoado e não se apercebe de nada. Por outro lado, os movimentos e as sensações sexuais aumentam o afluxo de sangue na área pélvica da mulher e as endorfinas produzidas pelo orgasmo passam sensações de bem-estar para o feto. Vários estudos referem que o terceiro trimestre – quando os enjoos já lá vão e a barriga ainda está com um tamanho “confortável” – é a altura em que a sexualidade do casal pode atingir novos patamares de descoberta e satisfação. Mais tarde, as relações sexuais perto da altura do parto levas às já conhecidas endorfinas a desempenhar um papel importante no despoletar do processo.
“O formato da barriga revela o sexo do bebé”
Com a vulgarização das ecografias, as “técnicas” ancestrais para adivinhar o sexo do bebé parecem ameaçadas de extinção. No entanto, ainda há quem acredite que o formato da barriga é um indicador infalível sobre o que aí vem: arredondado para uma menina e pontiagudo para um menino. No entanto, a dimensão e o feitio da barriga estão relacionados com inúmeros fatores, sendo que o sexo do bebé não é um deles. A estrutura física da mãe, se se trata de uma primeira gravidez ou não ou a posição do feto no interior do útero são alguns dos dados desta equação. Nunca se é menina ou menino.
Já agora: também não é certo que as meninas “tiraram a beleza” à mãe ou que os meninos fazem o contrário. Ou que os diferentes tipos de desejos se relacionam com o sexo do feto. Ou que movimentos com agulhas e linhas também permitem saber. E nem sequer as ecografias são 100 por cento seguras. A única maneira garantida de descobrir é através de uma análise ao sangue. Ou quando o bebé nasce.
“Bijuteria e tesouras são perigosas”
São dos mitos mais antigos e relacionam o uso destes objetos com sinais ou problemas de saúde do bebé.
O uso de bijuteria ao pescoço, nomeadamente colares com medalhas ou outros pequenos objetos, está relacionado, segundo as crenças, com o aparecimento de marcas na pele da criança, mas não há qualquer tipo de fundamento científico nesta relação. Já quanto às tesouras, existe a lenda de que as transportar no bolso leva a que o bebé nasça com lábio leporino. Nada de mais falso ou de distante da ciência. O lábio leporino, ou fenda palatina, é uma malformação que resulta do desenvolvimento incompleto do palato (céu da boca) ou do lábio durante a gestação que pode, ou não, advir de uma predisposição familiar mas que, na maior parte dos casos, tem causas desconhecidas.
“Exercício físico? É tempo de parar”
Nada mais falso. É tempo de adaptação, não de paragem. A prática de exercício durante a gravidez melhora a condição física em geral, favorece a circulação sanguínea, aumenta os níveis de autoestima e de bem-estar psíquico, ajuda a combater a fadiga e a controlar o peso. No entanto, é importante evitar atividades que possam ter impacto no normal decorrer da gestação e na saúde da mãe e do bebé. Natação, caminhada e hidroginástica são tao boas opções mas o melhor é pedir opinião do médico antes de iniciar qualquer programa desportivo.
Superstições para todos os gostos
Para além dos grandes mitos, existem mil e uma superstições relacionadas com a gravidez, na esmagadora maioria destinadas a garantir um “bom sucesso”, ou seja um bebé saudável e uma recuperação plena da mãe.
Estas “atitudes ou pensamentos mágicos”, de um ponto de vista antropológico e psicológico eram como um “seguro” para atravessar a gravidez e enfrentar o parto, duas situações que, em tempos não muito recuados, eram arriscados. Hoje, estes princípios despertam mais sorrisos do que vontade de os seguir.
Alguns dos mais frequentes são:
- Não beber líquidos pela garrafa nem por palhinhas;
- Não beber por copos lascados;
- Não amarrar nada na frente da barriga;
- Não cheirar odores fortes;
- Não usar roupas estampadas;
- Não fazer croché nem ponto de cruz;
- Não montar o berço antes de o bebé nascer;
- Não passar debaixo de escadas;
- Não assistir a funerais;
- Não ser madrinha de um bebé;
- Não deixar a roupa do bebé estendida ao luar;
- Sentar-se sempre encostada a uma parede;
Nove meses, nove luas ou 40 semanas?
“Uma gravidez dura nove meses”. Parece não haver afirmação mais verdadeira que esta, mas será bem assim? Um simples exercício matemático indica que as 40 semanas apontadas pelo médico apontam, mais semana menos semana, para dez meses de gestação. Então, em que ficamos?
Tradicionalmente, são contados noves meses de gravidez pois a mulher começa a “desconfiar” quando lhe falta a menstruação. E, se confirmado que está à espera de bebé, o parto acontece sensivelmente nove meses depois dessa altura. No entanto, em termos científicos e obstétricos, o tempo de gestação começa a ser contado a partir do primeiro dia da última menstruação ocorrida antes da conceção. Ou, por outras palavras, cerca de um mês antes da tal “falta”.
Contas feitas, estamos perante dez meses, ou quarenta semanas. Destas, duas correspondem à fase préconceção e as restantes 38 à gestação propriamente dita. É também este calendário que auxilia o médico a determinar em que trimestre a grávida se encontra.
Outra contagem mais antiga afirma que todas as gravidezes duram, sensivelmente nove meses lunares, cada um com 28 dias. Mais: há quem jure a pés juntos que a fase da Lua influencia o início de trabalho de parto, com as fases Crescente e Cheia a corresponderem a um maior número de nascimentos.
Fonte:
Pais & Filhos, número 297, outubro 2015