Depois da surpresa, a preocupação: há dois bebés a crescer dentro de um útero que, idealmente, seria apenas para um. A disputa de espaço é o menor dos problemas na gravidez de gémeos: o mais certo é ser imediatamente alertada para o fato de se tratar de uma gestação de risco. Mas de nada vale entrar em pânico! Na prática, significa que terá um acompanhamento médico mais rigoroso, com mais consultas e exames, uma vez que há uma maior probabilidade de desenvolver alguns problemas de saúde (materna ou fetal). E nada melhor do que apertar a vigilância para garantir que tudo corre bem.

Em termos fisiológicos, uma gravidez representa uma carga adicional de stresse e esforço para o corpo. Numa gestação gemelar, esta sobrecarga é naturalmente maior. Por isso, é sempre considerada uma gravidez de risco. A prematuridade é a principal preocupação (rutura precoce da bolsa e parto prematuro), mas também existe um aumento de risco de situações como a hipertensão arterial, pré-eclâmpsia e diabetes.

Dois a Bordo

“O útero está preparado para a gestação de um feto, a presença de dois em simultâneo aumento o risco de parto prematuro: 50 por cento das gravidezes de dois gémeos terminam antes do termo (antes das 37 semanas)”, explica a obstetra Teresinha Simões, adiantando que “quanto maior o número de fetos, maior o risco de nascimento prematuro (92 por cento dos trigémeos nascem com menos de 37 semanas)”.

Além da prematuridade, “as grávidas de gémeos têm o dobro do risco de ter hipertensão e diabetes em comparação às de gravidez simples, e os gémeos têm maior risco de serem mais leves ao nascer e terem mais malformações”, acrescenta a especialista. Por isso, estas grávidas “necessitam de mais consultas e mais exames e têm de ser vigiadas por obstetras”, aconselha.

Dois a Bordo

Mais consultas

A maioria dos médicos que acompanham grávidas de gémeos recomenda consultas quinzenais a partir das 20/24 semanas, para avaliar o colo do útero (a espessura é um bom indicador do risco de parto prematuro) e o crescimento fetal, entre outros aspetos não menos importantes como a tensão arterial. Quando os níveis de tensão se mantêm altos e constantes podem indicar uma situação de pré-eclâmpsia, uma patologia grave com complicações quer para a mãe, quer para os bebés, que muitas vezes culmina com a necessidade de realizar o parto antes do tempo.

Por tudo isto, é importante que a grávida leve “uma vida calma” e, dependendo da profissão, é aconselhado repouso a partir das 20/24 semanas exatamente “para reduzir o risco de parto prematuro”.

Dois a Bordo

Nos casos em que os gémeos partilham a placenta (monocoriónicos), a gravidez requer ainda mais cuidados e deve ser seguida em consultas especializadas. “Como a de Gravidez Múltipla da Maternidade Alfredo da Costa, que já vigiou, desde a sua formação, mais de 2500 grávidas de múltiplos e tem o apoio de uma unidade de ecografia muito diferenciada”, refere Teresinha Simões. Quinze por cento destes gémeos “vão desenvolver síndrome de transfusão feto-fetal que sem terapêutica condiciona a morte de um ou de ambos os gémeos, na quase totalidade dos casos. A morte de um dos gémeos monocoriónicos pode condicionar um risco de paralisia cerebral no sobrevivente de 50 por cento”.

Dois a Bordo

A síndrome de transfusão feto-fetal acontece quando os bebés partilham a mesma placenta, com troca de sangue entre ambos, que resulta num desequilíbrio: um dos bebés torna-se dador e o outro recetor. Em consequência, o primeiro cresce pouco e o segundo cresce demais.

Margarida Santos conhece bem esta situação: às 21 semanas de gestação foi informada de que os seus bebés partilhavam a mesma placenta e que um deles não estava a ser alimentado adequadamente. Por isso “não estava a crescer e era urgente resolver o problema ou então os dois poderiam morrer”. Em dois dias, Margarida foi encaminhada da Maternidade Alfredo da Costa para um hospital em Londres para ser submetida a uma cirurgia fetal endoscópica que permitiu salvar os dois fetos. “Foi um grande susto, tive muito medo de perdê-los, mas felizmente correu tudo bem, nasceram às 35 semanas e hoje tenho dois rapazes saudáveis e reguilas”, conta, com um sorriso.

Dois a Bordo

Aos pares

Sem sobressaltos de maior, a história de Mariana Seara Cardoso é a prova de que uma gravidez de gémeos pode correr muito bem. Aliás, no seu caso, não uma, mas sim duas gravidezes de gémeos. Com menos de um ano de intervalo!

“Tive duas gravidezes ótimas! O meu médico fazia sempre ecografias em todas as consultas. Tive uma ou outra ida a mais do que numa gravidez normal, pois estava tudo a correr bem e, por incrível que pareça, a segunda gravidez foi ainda melhor”. Mariana nunca precisou de estar de repouso por completo, mas “em ambas as gravidezes tive de fazer períodos de descanso ao longo do dia, em particular no fim das gravidezes, pois já estava muito cansada”. Trabalhou, das duas vezes, até às 20 semanas, mas “à parte do descanso, levei a vida normal”. Na primeira gravidez conseguiu até fazer exercício físico até eles nascerem. “Na segunda não pude, pois não só eram gravidezes muito próximas, como também já tinha trabalho suficiente com os outros dois filhos em casa”.

Das duas vezes, Mariana teve partos “muito rápidos” às 36 semanas de gestação. Aos 32 anos, tem quatro bebés em casa: a Matilde e o Tomás, com 18 meses, e a Maria do Carmo e a Francisca, com dois meses. Anda “cansada, mas muito feliz!”, como revela no blogue que criou para contar a história da sua família numerosa (www.aospares.pt)

Dois a Bordo

Plano de parto

Se está grávida de gémeos, o melhor é preparar a mala da maternidade (e o quarto dos bebés) mais cedo do que o normal. É provável que o parto aconteça antes das 37 semanas e mais vale ter tudo preparado, para não entrar em stresses desnecessários. Nas últimas semanas de gravidez, é importante rever com o obstetra o plano de parto, tendo em conta as posições dos bebés. “O parto vaginal é seguro nas gravidezes múltiplas de dois fetos se o primeiro gémeo estiver de cabeça para baixo (apresentação cefálica) e o útero não tiver cicatrizes”, defende Teresa Simões. O trabalho de parto tende a ser um pouco mais longo do que numa gravidez de um só feto, mas o período de expulsão não é demorado: os gémeos geralmente nascem com minutos de diferença. Se o primeiro bebé não estiver cefálico ou se houver outra contraindicação para o parto vaginal, o mais seguro é avançar para cesariana.

Imediatamente após o parto, os bebés são avaliados e, caso seja necessário, transferidos para os cuidados intensivos neonatais – o que é mais frequente do que o desejável, tendo em conta que podem ser muito prematuros ou bebés com baixo peso. É natural que precisem de ficar alguns dias – ou até mesmo semanas – na incubadora até atingirem o peso a estabilidade necessários para poderem ter alta. Mas nem sempre é necessário: tal como os dois pares de gémeos de Mariana Seara Cardoso, muitos nascem já perto das 37 semanas e são praticamente bebés de termo, prontos para ir para casa nos braços dos pais.

Dois a Bordo

O que esperar?

Se está grávida de gémeos, saiba com o que pode contar nas semanas que tem pela frente.

Os enjoos matinais podem ser mais intensos: os níveis da hormona hCG (gonadotrofina coriónica humana), associados às náuseas, são mais elevadas nas gravidezes múltiplas, pois isso é natural que os enjoos sejam intensos durante o primeiro trimestre da gravidez. A boa notícia é que geralmente passam ou diminuem depois das 12 semanas.

Os incómodos podem ser mais acentuados: as grávidas de gémeos têm mais probabilidade de ter dores nas costas, dificuldade em dormir, sensação de falta de ar, azia e cansaço, devido ao volume aumentado do abdómen.

Dois a Bordo

Não vai sentir os pontapés dos bebés mais cedo: apesar de ter dois inquilinos na mesma sala, os movimentos fetais só começam a ser evidentes por volta da 18-20 semanas, tal como numa gravidez de um feto.

Vai ganhar mais peso: numa gravidez de gémeos, é provável que aumente entre 15 a 20 quilos até ao final da gravidez (no caso de ter um peso adequado no início da gestação). Nas primeiras 20 semanas, o ideal é não aumentar mais de 500 g por semana.

Não é preciso comer por três: Coma pouco, de três em três horas no máximo, para não se sentir enfartada e maldisposta. Uma gravidez de gémeos requer uma ingestão de pelo menos 2700 calorias diárias.

Dois a Bordo

Amamentar não precisa de ser complicado: se deseja amamentar os seus bebés e está com receio de não conseguir, peça ajuda a uma conselheira de amamentação para garantir que tudo corre pelo melhor.

Alimente-se bem: para alimentar dois bebés, vai precisar de ingerir pelo menos mais de 500 calorias por dia para garantir uma produção de leite adequada.

Dois a Bordo

Fonte:

Teresa Martins

Pais & Filhos, número 298, novembro 2015

gravidez,médicos,parto prematuro,cesariana,incómodos,parto,exames,placenta,sangue,amamentar,conceção,bebés,obstetras,consultas,vigilância,peso,corpo,tensão arterial,pré-eclampsia,nauséas,gravidez de risco,calorias,stresse,gravidezes,gémeos,fetos,diabetes,prematuridade),problemas de saúde,útero,colo do útero,gravidez de gémeos,descanso,dois bebés,gestação de risco,acompanhamento médico,materna,fetal,gestação gemelar,hipertensão arterial,nascimento prematuro,trigémeos,malformações,crescimento fetal,monocoriónicos,ecografia síndrome de transfusão feto-fetal,mala da maternidade,parto vaginal apresentação cefálica,cuidados intensivos neonatais,incubadora,enjoos matinais,comer por três,alimentar,produção de leite,