Sejam porque a criança está doente ou de rotina, as visitas ao pediatra são sempre importantes, mas, entre o nosso horário de loucos e a agenda preenchida do médico, nem sempre é fácil tirar o máximo partido das consultas. E se a relação entre duas pessoas já tem potencial para gerar inúmeras crises, imagine-se esta, que se vive a três (a bem da verdade, normalmente, vive-se a quatro; mas vamos considerar o pai e a mãe como uma entidade única nesta tríade “pais, filhos e pediatra”).

De facto, “cuidar em pediatria tem uma filosofia muito própria”, diz-nos a pediatra Ana Simões, “uma vez que privilegia uma abordagem centrada na família”. Isto porque a família é, para todos os efeitos, o núcleo central do bem-estar da criança, a sua principal fonte de apoio e de cuidado no restabelecimento da sua saúde. Além disso, continua, “ser pediatra hoje não é o mesmo que há 20 anos, e não é raro que as preocupações que os pais trazem para a consulta tenham mais a ver com comportamento e educação do que com saúde propriamente dita”. Por isso, “a comunicação ganha ainda mais importância e temos de saber ‘devolver a bola aos pais com tato e bom senso, fazendo-os perceber (ou relembrar) que são competentes para cuidarem dos filhos, ao mesmo tempo que fazemos o nosso melhor para os ajudar a eles e à criança – porque ser pediatra também é ser um pouco psicólogo, um pouco sociólogo, um pouco educador. Nós somos aliados dos pais na promoção da saúde e bem-estar dos seus filhos, mas não nos podemos substituir a eles”, termina a médica.

Comunicar com o Pediatra dos Nossos Filhos

Mudam-se os tempos…

De facto, o tecido social mudou bastante ao longo dos anos, o ambiente que rodeia as crianças é hoje altamente complexo, e isso faz com que as suas próprias necessidades sejam diferentes do que eram há uma ou duas décadas. A juntar a isto, a informação a que os pais têm acesso é enorme, e a saúde dos seus filhos deixou de ser apenas uma questão de tratar a doença, para passar a ser algo mais abrangente, mais relacionado com o seu bem-estar e felicidade em geral. E assim o papel dos pediatras também se alterou, e o seu relacionamento com as famílias ganhou profundidade. “A relação entre o pediatra e a família é da maior importância. O conhecimento mútuo permite uma melhor comunicação, o que é fundamental para a satisfação de todos”, refere, a este propósito, o pediatra José Guimarães.

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Expectativas de parte a parte

Os pais devem poder esperar que o pediatra lhes inspire confiança, que seja objetivo sem abdicar da empatia, que não se feche na sua área de conhecimento e seja flexível na abordagem, que seja disponível e facilmente contatável (dentro dos limites do razoável e justificável), e que, sem abdicar do rigor científico, explique, aconselhe e informe de forma clara e percetível.

Mas a comunicação é uma via de dois sentidos, e o pediatra também tem direito a esperar algumas coisas dos pais. Que o informem claramente sobre a saúde e bem-estar da criança, sendo específicos nos detalhes. Que estejam minimamente informados, mas que não cheguem à consulta cheios de ideias incompletas ou pouco corretas que pesquisaram na internet (“já me aconteceu chegarem-me pais com várias folhas impressas de fontes online poucas seguras sobre os sintomas da criança e a tensão e frustração que isso me causa torna-se visível, por mais que tente disfarçar porque a verdade é que eu não tenho tempo para estar a confirmar ou a discordar com cada pedaço de informação que eles obtiveram”, conta Ana Simões). Que se mantenham focados durante a consulta, desligando o telemóvel e deixando outros eventuais filhos com familiares ou uma babysitter. Que cheguem a horas à consulta, e que, não podendo comparecer por razão de força maior, cancelem com a devida antecedência. E, último mas não menos importante, que confiem no seu diagnóstico e tratamento (“agora estamos no tempo das constipações”, explica a pediatra Ana Simões, “e muitas vezes o mais acertado é esperar para ver como as coisas evoluem mas são muitos os pais que não conseguem esconder o desapontamento, porque esperavam medicamentos e tratamentos”).

Para completar o ciclo, os pais não devem ter receio de dar feedback ao pediatra sobre a experiência da consulta, nomeadamente se sentiram que as coisas foram apressadas, que determinada explicação não foi bem dada ou que determinadas instruções não ficaram claras. Um bom médico quererá saber.

Os pais são especialistas nos filhos. Os pediatras são especialistas na saúde infantil. Se trabalharem bem juntos, os benefícios dessa relação vai refletir-se em que mais importa: a criança.

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Regras práticas

É legitimo que o médico também tenha expectativas em relação ao comportamento dos pais. O pediatra José Guimarães deixa-nos algumas regras básicas para que tudo corra sobre rodas durante a consulta:

“- Quando são consultas programadas, há que chegar dentro do horário combinado. Um atraso de 20 minutos faz atrasar todas as consultas que se vão seguir. Imagine-se o efeito se duas ou três crianças chegam atrasadas na mesma tarde! As últimas consultas poderão ter de esperar uma hora, com crianças pequenas!

- Ter o Cartão de Cidadão da criança, onde consta o número de utente de saúde, pois pode ser necessário fazer alguma prescrição e esse dado é fundamental.

- Normalmente é necessário despir a criança para ser observada e avaliada o peso ou o comprimento/altura. E é comum que a criança resista a despir-se, mas convém haver convicção por parte dos pais, caso contrário há choro e birras. Os pais não devem pedir licença para despir (“deixas-me tirar a camisola?”); é melhor informarem que vão tirar a camisola para que seja observada. A convicção dos pais dá confiança à criança.

- Não é bom ir à consulta sem marcação e sem aviso, pois isso desorganiza completamente as consultas que estão programadas. Um telefonema prévio é muito importante.”

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Fonte:

Rosa Cordeiro

Pais & Filhos, número 302, março 2016

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